segunda-feira, 5 de julho de 2010

Thaís - Capítulo 4 (Final)

Me isolei. O mundo, as pessoas, nada mais existia, só eu e a minha tristeza éramos reais. Eu acabava de ter me descoberto apaixonada por uma menina. Linda, perfeita, homofóbica. Eu não tinha medo de gostar de uma mulher em si, mas não podia permitir que ela reparasse o meu interesse e desaparecesse. Não. Era dor demais para encarar...

Então eu me fechei dentro de mim mesma. Textos nos cadernos, Death Metal no diskman. Ou Power Pop. Ou Grunge. Não importa. Vivia um caso de amor com a minha melancolia. O caso que eu deveria ter com Thaís.

E ela continuava caminhando numa corda bamba. Os passos firmes e lascivos. Não havia medo de cair. Ela me atraía como o chão atrai o suicida à beira do abismo. E eu não sabia se pulava. A adrenalina da queda livre de alguns milhares de metros para o clímax orgástico da queda. A morte. O corpo desfeito em pedaços, em mancha, em nada.
Eu não sabia que não tinha escolha. Eu não sabia que já estava caindo.

E eu me afastei do mundo, mas não pude deixá-la sozinha. Ainda mais quando soube que, a maior parte das meninas da escola já tinham se articulado para surrar Thaís. Desistiram por minha causa. Não sei como ou quando isso aconteceu, mas elas gostavam de mim. Sabiam que eu estaria ao lado dela para apanhar ou bater. Não importa. Eu era o seu escudo e ela, o verme que me comia por dentro; O vírus que derrubava as minhas defesas.

Então surgiram pessoas entre nós. Duas, três, quatro meninas. E quanto mais elas se aproximavam, mais ela se afastava. E doía a vê-la ir embora. Escoar, lentamente, como areia, por entre os dedos. Mas eu tinha que deixá-la ir. Era uma necessidade física. Não havia mais como sofrer por ela. Não havia como doer mais do que doía.

Incorporação. A cerimônia que nos dava as boas vindas à vida de normalistas Fumávamos na fila. Não haviam palavras. Era como se nossas presenças fossem o suficiente. Consolo, estímulo. Adeus. Em algum momento ela me disse algo sobre eu ter que escolher. Ou todos os amigos que tinha, ou ela. Ela me queria só pra si. Inteira, como antes. Não pude aceitar. Não poderia passar por tudo aquilo outra vez.

E ela se foi. Tive a sensação de vê-la chorando, mas não sei se era a minha lágrima que me fazia ver o mundo molhado.

E ela nunca mais atendeu as minhas ligações. E ela não me olhava mais os olhos. E ela pediu para mudar de turma. E fez outra amiga. Pouco mais de um mês depois, saiu da escola. Um dia, eu descia as escadas para o pátio e encontrei com a tal amiga. Raquel. Ela me parou e me entregou um cordão. Eu conhecia bem aquele pingente, havia dado para Thaís, logo quando a gente se conheceu. Ela me viu usando e pediu. E eu não sabia dizer não para si. Ela nunca havia tirado o cordão, desde então.

“A Thaís pediu pra te devolver”
“Onde ela está?, Ela tá bem?”
“Vai ficar. Está melhorando!”
“Pede pra ela atender quando eu ligar pra ela? Queria falar algumas coisas com ela.”
“Cara, fica longe da Thaís. Você não acha que já fez mal demais pra ela não?”
“Hã?”
“Ela se apaixonou por você e você virou as costas pra ela. Não, ela não precisa de mais isso na vida. Some, esquece. Tanto ela, quanto a mim. Se eu souber que você a ligou outra vez, você está fodida na minha mão. Não vai sobrar nada de você.”

Ela virou as costas e foi embora. Fiquei parada. A boca aberta, o coração disparado. O pingente caiu no chão, eu não peguei. Fui embora. Foi a última vez que ouvi falar de Thaís.

6 comentários:

  1. #@$%&*@$&%#@

    E depois de tudo que aconteceu, você ainda sai como vilã. Que injusto.

    Os primieros parágrafos cortaram meu coração.

    História maravilhosa!!! Amei ♥

    ResponderExcluir
  2. adorei *-* Adoro finais tragicos, adoro esse ar de FUUU no final. Lindo Lindo lindo.
    =)
    Ver de fora é até bonito. Mesmo.

    ResponderExcluir
  3. cara, partiu meu coração.
    mas é cm dizem, o primeiro amor é o q te detona mais, né?!

    ;*

    ResponderExcluir
  4. cara, há um texto da clarice lispector q acaba no mesmo clima do seu texto: "por não estarem distraídos".
    eu já fui apaixonada por alguém q ñ me dava a mínima, aparentemente. ainda bem q esse tempo passou.

    ResponderExcluir
  5. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  6. Queria um final feliz.
    já tava até imaginando vocês duas enquanto lia o terceiro capitulo.:/
    Abraço

    ResponderExcluir